Melancolia da Simplicidade – Crônica S.A.X. #15

A velocidade das mudanças no mundo atual é tão grande que até quem não completou trinta primaveras pode vociferar o maior clichê dos mais velhos: “NO MEU TEMPO… as coisas eram mais simples”. Até porque, em muitos casos, é uma constatação e não apenas uma impressão.
Na era do superatendimento e dos superserviços, pedir um simples cafezinho pode ser uma complicação. Você nem pensou no seu pedido e o superatendente – Garçom é coisa dos antigos – já vai logo perguntando: “Com açúcar? Adoçante? Descafeinado? Curto? Longo? Qual blend?”. Confesso que tenho preguiça de ir a essas cafeterias da moda – uma carta de cafés me parece exagerado. São tantos blends, sabores, regiões de origem e acompanhamentos – leite, chantilly, canela, noz-moscada, entre muitos outros – que fico totalmente perdido. E se você der sorte e acertar uma boa mistura, fica com a sensação de que poderia ter feito uma combinação ainda melhor se lembrasse das lascas de lima da pérsia. Lembrar, numa próxima visita, o que você acrescentou ao seu café maravilhoso é que vai ser o difícil.
Até a boa e velha Coca-Cola anda sofrendo desse mal – gelo e limão? Zero ou normal? Limão espremido ou à francesa? Acabaram até com os números do McDonald´s. Esses, todos sabiam – número um era o Big Mac com Coca-Cola e batata frita, o número três, a mesma coisa só que com o McChicken. Agora você precisa responder a uma infinidade de perguntas antes de terminar o seu pedido e apreciar seu hambúrguer. Claro que não sem antes responder “crédito ou débito?” na hora de pagar.
Não é só na gastronomia que a situação é essa – até uma tarde de cinema conseguiram complicar. Hoje você precisa escolher se vai assistir o filme em 2D, 3D ou IMAX… Som digital, Dolby Surround ou THX… E já tem estúdio prometendo filmes com odores. Não, muito obrigado. Já basta o cheiro das pipocas encharcadas de manteiga do camarada ao lado.
Mas são nos eletroeletrônicos que a coisa toda toma ares de tortura. Tente ir comprar um Dock para mp3 player (há sentido no termo ‘baixar um CD’ na internet?) – NO MEU TEMPO um televisor se escolhia pelo tamanho, uma TV de quatorze polegadas era pequena e uma de trinta era grande. No máximo dava para escolher uma marca melhor e talvez um controle remoto. Hoje você precisa fazer um curso de física e uma especialização em óptica para entender as possibilidades da sua TV. Plasma, LCD ou LED – ok, essas todos já dominam – mas será que o superatendente pode me explicar as diferenças entre uma TV HD, FullHD ou HDTV? Vai se FullHD você! O problema fica sério na hora das entradas e compatibilidades. Jogue sua TV pela janela se ela não tem: entrada de USB, pelo menos três entradas com a Tecnologia HDMI, compatibilidade com a TV digital e com a tecnologia DivX, ela também precisa ser de sangue azul, ou seja, vir com Blutooth e reproduzir com fidelidade a imagem em 1080i – acho que o i tem alguma coisa a ver com linhas – do seu Blue-Ray. Contraste parece ser a palavra do momento, quanto mais contraste melhor é a sua TV, mas isso só enquanto a TV 3D não tomar conta do mercado e ao errar um comando no seu controle remoto o personagem do filme sai da tela e te dá uma pancada na cabeça, só para você ficar esperto e se FullHD também.

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