O Brasil é um país cheio de manias e uma das mais irritantes é a de juntar grupos de artistas em safras, as “novas safras”. Roberta Sá, capa da nossa última edição, foi incluída em uma, a safra das novas cantoras da Música Popular Brasileira, que colocava na mesma sacola artistas muito diferentes como Ana Cañas, Mariana Aydar, Marina de La Riva, Céu e Vanessa da Mata, grupo que definitivamente não forma uma unidade.
A música sempre foi campo fértil para essas safras. Tivemos a safra do rock de Brasília, de onde saíram bandas como Capital Inicial, Legião Urbana e Plebe Rude. E mais recentemente uma safra formada pelos filhos de grandes artistas, como o projeto Artistas Reunidos, lançado pela Trama, gravadora modernosa de João Marcello Bôscoli, filho de Elis Regina com Ronaldo Bôscoli, que trazia Luciana Mello e Jair de Oliveira (Jairzinho, como era chamado na época), filhos de Jair Rodrigues; Max de Castro e Wilson Simoninha, filhos de Wilson Simonal; Pedro Camargo Mariano, filho de Elis e César Camargo Mariano; e Daniel Carlomagno, o único sem descendência na MPB. Isso só para ficar nas que deram algum fruto, pois a maioria desaparece logo depois que a mídia planta uma outra safra.
Uma que atualmente acompanhamos o auge é a dos novos comediantes. Pânico na TV e CQC invadiram as redes abertas e os noticiários com boas audiências e um humor de gosto discutível. Legendários e É Tudo Improviso têm uma audiência menor e gosto mais discutível ainda. Dezenas de espetáculos de stand up comedy tomam os teatros das grandes cidades brasileiras, às vezes, infelizmente, de forma amadora e banal. Confesso que já vi algumas apresentações constrangedoras. Só porque o camarada sabe contar uma piada acha que pode montar um espetáculo de stand up e se achar o Seinfeld. Alguns copiam descaradamente alguns comediantes americanos. Chris Rock, que já teve seus números presentados na TV a cabo, é o mais copiado.
A MTV deve ter mais programas de humor do que de qualquer outro assunto, inclusive música. O humor na MTV começou a ter certo destaque com Marcos Mion e o seu irreverente Piores Clipes do Mundo. Outra turma que fez sucesso no canal musical foi o programa Hermes e Renato. Atualmente, estão no ar os programas 15 Minutos, Comédia MTV, Badalhoca, Quinta Categoria, Furo MTV, Infortúnio e Didiabólico. Marcelo Adnet, Dani Calabresa, Bento Ribeiro, Fábio Rabin, Rafael Queiroga, Guilherme Santana, Paulinho Serra, Tatá Werneck, Rodrigo Capella, Erik Gustavo e Ronald Rios se dividem em um ou mais programas. Muitas vezes, de toda uma safra, apenas alguns frutos são de boa qualidade e os destaques são mesmo Marcelo Adnet e Ronald Rios.
Ronald Rios, que também vem dando as caras em alguns programas de rádio, é o mais radical com o seu Badalhoca e consegue ótimos momentos com apenas uma caneta, um pedaço de papel e um bom texto em intervenções com pouca produção e muita criatividade.
Marcelo Adnet é de fato a grande estrela – é capaz de imitações hilariantes e quadros de um sarcasmo inspirador. Numa dessas zapeadas noturnas, me deparo com ele num vídeo clipe de funk, de produção
tosca do programa Comédia MTV, chamado “Gaiola das Cabeçudas”, que brinca com grandes pensadores da humanidade. Uma rápida pesquisa no youtube e você pode ver o vídeo na íntegra: “A de Alejadinho, B de Beethoven, C de Camões, D de Dostoievski, E de Einstein…”, e por aí vai. Num determinado momento, o ritmo muda e ele solta “Penso, logo existo / penso logo existo / foi Descartes quem disse isso”. O verso principal do sucesso “Um tapinha não dói” virou “Li tudo do Leon Tolstoí” e o insuportável “Crééééu! / Crééééu!” virou “George Orwell! / George Orwell!” ou “Buñuel! / Buñuel!”. Coisa de gênio!
Crônica Publicada na S.A.X. Magazine 16 (Out/2010)